domingo, dezembro 22, 2013

Pauline... Pauline...


Quadro de Francine Van Hove

Pauline... Pauline...
O dia começava sempre assim. Bastava chamar duas vezes e Pauline descia.
Pronta, cabelos molhados, olhos grandes, espertos.
Pronta pra trabalhar.
Fazia de tudo.
O Curso de enologia em Davis era pra ela um diploma que ajudava a conseguir emprego, mas os ensinamentos do avô Bertrand sempre prevaleciam.
Assim como o avô, ela fazia tudo.
Desde o trabalho mais simples como limpar tanques, peças e até o chão da vinícola, até definir o corte com uma sabedoria incomum.
Pauline era da região, o avô Bertrand era figura conhecida e respeitada no Rhône.
Ela nunca se escondeu atrás do nome do avô, mas era inevitável que lembrassem dele assim que o sobrenome Lefevre era pronunciado.
Pauline conhecia tudo e mais um pouco.
Trabalhava como ninguém.
O que ninguém entendia era o estilo de vida de Pauline.
Mesmo sendo bela e bem sucedida, não saía, não se divertia, não namorava.
Só pensava mesmo em trabalho. Nada mais.
Só que a colheita de 1999 trouxe uma verdadeira legião estrangeira para o trabalho.
Pessoas da Austrália, Estados Unidos, Portugal, Albânia, Suécia, Japão...
No primeiro dia Pauline já fez amizade com todos, tirava dúvidas, respondia perguntas, era a enóloga mais acessível do Rhône.
Olivia, uma australiana alta, magra, loira, olhos verdes e um sorriso encantador, perguntava tudo e mais um pouco.
As duas ficaram amigas e nos dias seguintes não se largaram.
Colheita, recepção, triagem, estavam em toda parte.
A semana passou rápido.
Uvas colhidas e hora de ir embora.
A colheita foi excelente, o trabalho impecável.
Ninguém viu a despedida de Pauline e Olivia.
O vinho fermentou, foi para as barricas e a vida seguia normalmente.
Pauline... Pauline...
Madame Lambert chamou as duas vezes como de costume.
Chamou mais duas: Pauline... Pauline...
Uma virada de maçaneta e o quarto vazio.
Na mesa uma carta breve e objetiva:
-Vinhos fermentados, barricas cheias... Volto para o corte e deixo meu telefone para qualquer dúvida...
As colheitas na Austrália não coincidem, posso trabalhar mais e melhor em dois continentes...
A vida de Pauline ficou mais colorida. Os vinhos australianos ficaram excelentes, os do Rhône continuaram impecáveis. Olivia e Pauline formaram uma bela dupla.

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