Quando o sino da igreja soava Vincent descia correndo, tomava um banho frio, vestia as roupas com rapidez, os sapatos, um copo de leite, pão, uma rápida escovada de dentes e rua.
Nenhum outro jovem enólogo do Rhône tinha tanta pressa!
Vivia correndo.
Vinhedos, escritório, laboratório, conversa com clientes e Marie.
Marie tinha o rosto mais lindo do Rhône. Tinha o corpo esguio, pernas marcadas pelos 15 quilômetros diários de pedaladas e um olhar sedutor.
Como se não bastasse tinha bom humor, sorriso no rosto e simpatia.
Muita simpatia!
Enquanto pedalava Vincent trabalhava nas vinhas.
Almoçavam, namoravam e Marie seguia para o trabalho na prefeitura. Vincent seguia para o laboratório e fazia cortes com os vinhos dos 18 produtores que contavam com a sua consultoria.
No final da tarde os dois seguiam para o restaurante do amigo Gilbert. Comiam, bebiam, namoravam, namoravam, namoravam...
Frequentemente dormiam juntos na casa de Vincent.
Tudo uma maravilha não fosse a vontade de Marie.
Ela estava cansada dos 5 anos de namoro sem compromisso, sem anel de noivado, sem promessas, sem nada.
Um dia Marie desapareceu.
Foi passar uns dias na casa da tia em Carcassonne.
Refletiu, chorou, sofreu.
Vincent ficou apavorado.
Primeiro pensou em sequestro, depois pensou em traição e por fim, percebeu o descontentamento de Marie pelos lábios do fofoqueiro Gilbert.
Procurou de todas as maneiras encontrar Marie. Quando percebeu que a procura era em vão se fechou em casa.
Os clientes telefonavam e o telefone não respondia, os vinhos foram deixados de lado. Os cortes foram feitos por assistentes, a barba cresceu, o peso diminuiu, os olhos ficaram inchados, vermelhos e as lágrimas caiam sem ordem, sem ritmo, com pressa, com calma, caiam.
15 dias depois Marie voltou.
Gilbert correu até a casa de Vincent.
Vincent pulou da cama, pegou a bicicleta e voou ao encontro dela.
Marie estava descalça, sentada na escada da entrada da casa ao lado do cachorro Bill (homenagem ao ex presidente dos Estados Unidos Bill Clinton que povoava os sonhos de Marie).
Num estado deplorável Vincent se aproximou. Nenhuma palavra. Os olhos de Marie brilhavam.
Vincent estava com aparência de um jovem senhor.
Sentou-se ao lado dela. Cabeça baixa, olhos cheios d´água. No olhar um misto de desespero, arrependimento e felicidade.
-Salut Marie!
-Salut Vincent!
-Não quero mais passar por isso. Não quero ficar sem você nem mais um dia!
-Também não quero Vincent, desde o começo.
-Gilbert me disse...
-Não diga nada. Gilbert é um fofoqueiro!
-Quero me casar com você o quanto antes.
-Também quero, mas temos tempo.
-Como temos tempo. Ficou brava comigo, passou dias fora, nem me telefonou.
-Precisei viajar, meu tio morreu, fui apoiar minha tia. Deixei recado na tua secretária eletrônica, avisei Gilbert.
Vincent caiu na risada num misto de felicidade e raiva do fofoqueiro da cidade. Marie riu ainda mais e 15 dias depois lá estavam eles, no altar.
O padrinho Gilbert tinha ainda marcas de um soco no olho, provocado pela fúria de Vincent...