A viagem seria um tédio.
Quase 12 horas dentro de um avião não é um exercício de paciência.
Marcelo comprou livros, se informou sobre a programação de entretenimento à bordo, pediu ao médico um remédio pra dormir, pensou em tudo.
Quase tudo.
Não imaginava que sentaria ao lado da bela e simpática Elodie.
Ele não falava francês, mas ela falava português com um sotaque tão charmoso, que podemos dizer que falava português melhor que os portugueses...
Enquanto arrumava a bagagem de mão, e nem sabia ao certo onde se sentaria ela já puxou assunto.
Ele levou um susto!!!
-Será que é comigo???
Era.
A conversa só não durou mais tempo porque o voo era direto, sem escalas...
3 beijos no rosto e um cartão.
Foi o que Marcelo ganhou depois de 12 horas de conversa e nem um segundo de sono.
O normal seria chegar no Hotel e dormir, mas depois daquela noite o sono não chegava de jeito nenhum.
Resolveu ir direto no endereço do cartão.
Na loja de vinhos, Marcelo perguntou em inglês e tudo que ouviu foi uma espécie de sopro e um balançar de ombros.
Mas parece que as palavras em inglês foram bem compreendidas.
Elodie desceu as escadas e nem parece que tinha perdido uma noite de sono.
Os olhos verdes brilhavam.
O andar quase que flutuante e o corpo leve e ligeiro parecia uma folha levada pelo vento.
A felicidade de Elodie era clara. Direta.
Dessa vez como se fossem velhos conhecidos ele ganhou um abraço.
Um belo abraço diga-se de passagem.
Elodie agarrou sua mão e saiu pela Rue du Sentier entre lojas de queijos e boulangeries...
Os dois conversavam como se tivessem anos de convivência.
Andaram por duas horas e marcaram de se encontrar a noite.
Marcelo voltou ao hotel, tomou um banho e esperava a hora do encontro quando...
Pegou no sono.
Dormiu até o dia seguinte deixando a bela Elodie esperando por horas em um bistrô na Île Saint Louis.
No dia seguinte Marcelo correu para a loja de vinhos.
Falou inglês, ouviu o sopro, viu o balançar de ombros e nada de Elodie.
Esperou por horas vendo cada um dos 2500 rótulos da loja.
Saiu par almoçar, voltou, esperou mais 2 horas.
Comprou uma garrafa de Champagne.
Tentou ouvir mais do que um sopro.
Tentou até algumas palavras em francês.
Nada.
Voltou para o hotel e nem o sonho de conhecer a Champs Elysées animava Marcelo.
A noite resolveu voltar para a loja e esperar a noite toda até que as portas abrissem.
Por volta das 9 da manhã o mesmo sopro, o mesmo balançar de ombros e mais nada.
Entrou na loja e ficou vendo os vinhos.
Encontrou um inglês que lhe explicou cada rótulo e cada região.
Foi almoçar, voltou, comprou outra champagne, esperou e recebeu um bilhete do atendente da loja: Imagino que tenha dormido, estou no Loire, volto hoje mesmo.
20 hs no mesmo bistrô.
Dessa vez Marcelo chegou as 6 da tarde e esperou até a chegada de Elodie.
As 8 em ponto ela entrou flutuando.
Os cabelos longos pareciam em câmera lenta, acho que Marcelo viu aquela imagem em câmera lenta.
De novo nem bem sentou e a conversa fluiu.
Saíram e andaram por toda Paris.
Beijaram.
Abraços, palavras e até planos.
Quando passavam ao lado do Rio Sena ela deu pra ele um cadeado.
Marcelo se despediu e ele voltou pro hotel sem entender nada.
Elodie já tinha deixado claro que antes de ficarem juntos, ele teria que entender o cadeado.
Aí sim podia procurá-la.
Mais uma noite sem dormir.
Andava com o cadeado pra cima e pra baixo.
Perguntava em inglês para todos os franceses que encontrava.
Foi por acaso que passou pela Pont des Arts e viu os cadeados pendurados por toda a grade de proteção entre a calçada e o rio.
Olhou, examinou e viu o que significava.
Prendeu o cadeado escrito com um prego: Marcelo e Elodie.
Voltou correndo pra loja, ouviu de novo um sopro e um balançar de ombros, mas logo depois viu Elodie.
Marcou o jantar e sinalizou que tinha matado a charada.
Comeram, caminharam e chegaram até a ponte.
Marcelo marcou o lugar exato com os passos.
25 passos e lá estava o cadeado.
Elodie olhou, abraçou Marcelo e daquele dia em diante os dois estavam presos.
Um ao outro.
Como de costume.
Como normalmente acontece em Paris...