Acordar ainda de noite, ir para os vinhedos e trabalhar até o anoitecer não é nenhuma novidade para Mathias.
Utilizar boas barricas, elaborar vinhos com carinho também não.
Aprendeu com o avô a utilizar leveduras indígenas, tratar a terra com respeito, trabalhar com amor e engarrafar apenas o que dá prazer em beber.
Claro que os vinhos de Mathias são maravilhosos, mas vendem bem menos que alguns vinhos medíocres produzidos na vizinhança.
O avô não ensinou nenhuma técnica de marketing, nem a investir hoje para ganhar em um ano ou dois.
Os vizinhos vendiam os vinhos para diversos países, participavam de feiras, gastavam fortunas em viagens e produziam vinhos comuns.
A vida de Mathias era sempre a mesma, não vendia nem mais, nem menos. Produzia sempre pouco e todos os anos sobravam algumas garrafas da safra passada. Não conseguia vender tudo, mesmo produzindo os melhores vinhos da região.
Marcel, filho mais velho, passou 5 anos em Nova York trabalhando em operações com a Nasdaq. Vinho não era o negócio dele, mas modernidade sim.
Passou, como sempre, 15 dias de férias com a família e dessa vez resolveu palpitar.
Já no primeiro dia acordou ainda de noite e acompanhou o pai nos vinhedos, conversou sobre os dias de hoje e sobre as coisas que há bem pouco tempo vivíamos sem, mas se tornaram indispensáveis.
Mathias é um típico vigneron, não quer saber de conversa mole!
No segundo dia Marcel enviou e-mails convidando todos os vignerons da região para uma prova às cegas, avisou sites especializados, blogs, jornais, guias, revistas, movimentou prefeituras, cooperativas e todas as appellations do Languedoc.
Mathias, quando soube, balançou a cabeça, tinha vergonha de competir com os amigos.
Um dia antes da prova lá estavam as garrafas, os jurados e nem Marcel acreditava no que havia feito.
Uma comissão organizadora preparou as garrafas, taças e tudo estava impecável.
Foram 209 amostras, só brancos e tintos.
Os vignerons acompanharam de perto, sem saber que garrafas provavam os jurados.
Marcel havia nascido nos vinhedos, escolheu outra profissão por vocação, mas amava aquilo.
Foram 2 dias de provas, não dava para provar tudo em um dia só.
Quando saiu o resultado, Mathias ficou vermelho como um pimentão.
Vergonha de fazer o melhor, vergonha de parecer superior, de precisar falar com jornalistas e de olhar para os amigos do dia a dia que não paravam de dar os cumprimentos.
Naquele ano não sobrou nem uma garrafa.
No ano seguinte precisou subir os preços.
Dois anos depois Mathias se acostumou com a fama, mas continua humilde como um franciscano.
Marcel continua na Nasdaq, mas organiza a prova todos os anos.
Mathias não usa celular, internet e também não dirige, mas continua elaborando vinhos como fazia o seu avô.
-"uma vez na vida precisamos desse tipo de tecnologia. Meu filho fez isso por mim! O fundamental é fazer vinhos com amor. Isso eu sempre fiz".
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